Páginas

Aviso

O autor adverte que o conteúdo dos textos a seguir pode ser de origem real, imaginária ou onírica. Logo, em se tratando de semelhanças com o cotidiano, os mesmos podem distorcê-lo em intensidade e veracidade dos fatos.

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

A história de uma merda

De todas as merdas, ela foi a mais barulhenta
Tua queda, ovacionada pelos fungos e bactérias, era a coisa mais interessante que passava por ali em horas
Uma luz naquela atmosfera inerte e obscura
Microrganismos de várias espécies se amontoavam para acompanhar o aspirante a hospedeiro
O vaso sanitário mais parecia um coliseu, com o guerreiro a flutuar nas águas plácidas daquele lago transparente
Ao mesmo tempo, as paredes frias ferviam com a agitação daqueles seres imperceptíveis ao olho nu
Havia praticamente uma competição de quem seria o melhor parasita
Afinal, todos se achavam mais dignos que a merda
Fétida, disforme e ainda por cima egoísta!
Brincando com tantos corpos por aí. Abandonando-os no seu momento de criação.
Morte à esposa dos intestinos e amante dos esgotos!
Mal se ouvia o que aquela multidão externava
Gritos que mais pareciam sussurros
"Joga pedra na merda, joga bosta na merda!"
As ofensas eram quase que harmoniosas
"Ela é boa de boiar, ela é boa de sumir!"
Como versos de uma canção qualquer
"Ela sai de qualquer um, maldita merda!"
A merda, estática, assistia tudo sem esboçar nenhuma reação
Afinal, ela tinha plena noção do que era, das merdas que a levaram a agir como ela agiu
E que somente os corpos sujos, infectados pela sua sujeira, poderiam falar dela assim
Cínicos, procariotos fingiam apreço. Debochados, eucariotos encenavam respeito
Quando a merda passava, circulando por toda a porcelana, provocava uma onda de silêncio
Ninguém era evoluído suficiente para agir melhor que um pedaço de excremento
Na sua despedida, seguindo o seu caminho por entre os canos, a merda ainda não compreendia: por que tanta gente que não é merda, com tanta merda a julgaria?
Criaturas que morreriam se achando reis e rainhas daquele ecossistema.
Nesse instante, a tampa da privada se fechava.
Desde então, pouco importava para a merda as criaturas que viviam ali. Na verdade, ela até achava graça de mais essa tentativa falha de imergi-la em meio àquela escuridão.

Inspirado em um motivo secreto.

Caio Sereno.

quinta-feira, 23 de julho de 2015

Te perdoo

Te perdoo
Pelo amor em que te afundas
Que em cenas tão imundas
Não se desfaz
Te perdoo
Por sonhares em vão
Por querer sempre mais

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Seu porquê

Ouço o teu discurso de censura
Cheio de arguições
E revelo o meu outro lado
Certo de ser loucura
Alguém pensar como você
Me afasto mais uma vez
Como tanto já fiz de você
Chego até a estranhar o que há tanto eu sinto
Transformo a minha saudade em medo
Te dizendo nada sobre tudo
Mesmo que sobre mim
Te pedindo um apoio silencioso
Mesmo que você não queira assim
Te amando ainda que se esvaia a vontade
Que eu sei não ter fim
Assim, eu finjo estar inteiro
E preservo os teus sorrisos
Já tão escassos
Porque pode até não parecer
Mas eu só quero ser feliz também
Melhor ainda se estamos de bem
Sabia?
Às vezes parece que você esquece
Que a gente se parece
Sem ao menos querer
E eu me vejo ofendido e não acho ser tão parecido
Quando estou bem próximo a ti
E agradeço por estar só
Ando preferindo a companhia do espelho
Ele sabe da minha alegria
E até sorri de volta para mim
Calado
Porque a sua semelhança acolhedora
Foi tudo o que você não me cedeu
E você aí
Cheio de arguições
Sempre se perguntando
O porquê de eu ser o que eu quis.

Caio Sereno.

sábado, 21 de fevereiro de 2015

A garota do mês de fevereiro

Ela me veio com um sorriso vermelho,
Lábios que sobressaltavam na multidão.
Toda a sua euforia era enebriante
E fazendo-se de louca e delirante
Ela esbanjava a sua satisfação.
A sua face pintada, branca de fantasia
Tinha um quê de alegoria
E beleza de fim do dia.
Por mais que ela se transformasse,
Em mil foliões eu a encontraria.
A garota do mês de fevereiro era otimista.
Para ela, o carnaval não acabaria
Quando chegasse a quarta-feira de cinzas.
E nessa doce ingenuidade,
Ela acordava já com serpentinas
E saldava as ruas banhada em confetes
Para inspirar os corações ranzinzas.
Não é sua culpa esse mente imatura.
Logo ela, nascida de uma aventura
Nos lençóis embriagados de excitação.
Hoje, ela reclama da demora,
Chora em frente ao espelho que outrora
A viu tão colorida e feliz.
E eu já desesperado, sonho com a Colombina
E retorno à minha rotina
Como um Pierrô aprendiz,
Mas que vê solução na tristeza
Pois haverão carnavais com certeza
E ainda hei de ser seu Arlequim.

Caio Sereno.