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O autor adverte que o conteúdo dos textos a seguir pode ser de origem real, imaginária ou onírica. Logo, em se tratando de semelhanças com o cotidiano, os mesmos podem distorcê-lo em intensidade e veracidade dos fatos.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Efeito Molinete – Parte III

     
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     Uma vertigem descomunal tomou conta de seu corpo. Uma aflição sem fim tomou conta de seu espírito. Acabara de receber a notícia de que Bruna estava à caminho do hospital, amparada por um homem cuja identidade não foi revelada nem questionada no instante por Márcio. A partir dali, nada afligia mais a sua cabeça do que a imagem da possível morte de sua esposa e seu filho. Além do fato de que toda a culpa do incidente pesava a sua cabeça, que tonta, não sabia como reagir àquela situação. Olhou para o copo ainda cheio, respirou fundo, procurou as chaves do carro, deixou uma nota de cinquenta reais, e um pouco cambaleante, deixou o bar para atravessar a cidade, rumo ao lugar onde Bruna estava.
      Mal conseguira virar as chaves. Quando conseguiu, não foi capaz de identificar qual direção seria a certa, de repente, não sabia mais de nada. Ainda tinha forte para si a imagem da sua família em sono eterno. Novamente, respirou fundo, buscou forças nas risadas, nos cafunés, nas manias e até nas birras de Bruna, e então percebeu como sentia falta da única mulher que um dia conseguiu amar de verdade, e como a havia maltratado durante os últimos tempos.E quão belo seria ter os dois ao teu lado. Bem em cima na estante, eles três, sorrindo, uma verdadeira família. de porta-retrato. Quão lindo seria! E a beleza que passava em seus olhos, inundados pelas lágrimas de arrependimento, iluminam-se por raios fortes de luz. Retos, grosseiros e cada vez maiores. Márcio conseguira desviar o carro a tempo, caindo assim sobre um riacho que por ali passava. Mesmo que desesperado, e a motorista do outro carro quisesse ajudá-lo, ele negou a assistência, e mancando, seguiu andando para o hospital.
      Horas depois, abruptamente, e aos prantos, Márcio chega ao hospital e desesperadamente se joga sobre a enorme porta branca que ali havia. Olha ao seu redor e consegue enxergar lá ao longe, no corredor, uma imagem embaçada, mas mesmo assim reconhecível, de Bruna atravessando em direção aos fundos do hospital, acabada, nos braços de João, seu melhor amigo. Márcio não teve coragem de seguí-la. Ao invés disso, foi no sentido contrário, para o apartamento do casal, lugar onde pouco esteve recentemente, e por isso, achou ele, nunca o procurariam ali.
      Já mirando a porta, como se fossem necessários dez homens para girar aquela chave, Márcio abriu a porta e jogou a face sobre ela. Então virou para o apartamento, fez milhões de reflexões em poucos segundos, serviu-se de um copo de uísque e sentou-se na poltrona. Após um tempo, levantou-se, debruçou-se na janela e estava decidido a se matar. Porém uma voz o chamou naquele momento crucial, e ao olhar para trás, deparou-se com ela:
      — Alice?
      E ali, dona dos cabelos mais vermelhos e vibrantes que ele já tinha admirado, estava Alice, descabelada, desesperada, machucada e fazendo continuamente um gesto de negação com a cabeça, pedindo para que aquilo não fosse verdade.
      — Márcio! O que é isso? Quando eu finalmente consigo te encontrar novamente, é numa batida de carro, onde você me ignora e segue sozinho pela estrada a fora, sem dar satisfações. E agora que chego aqui, te vejo à beira de um abismo, quase morto.
      E Márcio se atentara à uma parte de sua fala. Descendo da janela, ele faz uma pergunta.
      — Espere, por que você estava atrás de mim?
      Alice, agora mais calma, respondeu fazendo uma cara de final de romance.
      — Eu não sei o que me deu, mas desde aquele dia em que você jurou. ao ir embora, que me reconheceria tempos depois, eu não fui capaz de pensar em outra coisa. Tenho te procurado nas redondezas naquele lugar, quem sabe até para te encontrar com outra, mas mesmo, saber que você não foi um delírio. Eu não consigo acalmar o meu sono, focar a mente no trabalho, a loucura de que você não apareceu em minha vida por acaso por provocar isso tudo em mim é a única coisa que permanece acordada na minha cabeça. E tudo iss…
      Sei que depois daquele beijo a história bem que se repetiu. Márcio começou a sair com Alice. Márcio pediu Alice em namoro. Alice aceitou. Márcio e Alice moraram juntos. Márcio pediu Alice em casamento. Alice aceitou. Alice ficou grávida. E Márcio foi o melhor pai de todos.
      É engraçado com o destino às vezes se encarrega de nos levar quase à morte, e como numa brincadeira de criança, um dia nos revela o que havia por trás daquela escuridão. Talvez não seja a maneira mais prazerosa de tomar consciência disso, mas como é bom saber verdadeiramente a razão do nosso viver. Hoje Márcio vive para a sua filha, e reza todas as noites para que um dia, no céu, seu filho perdoe as suas atitudes.

Fim.

Caio Sereno.

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